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Internet no campo cresce, mas qualidade da conexão é baixa: ‘Fui educado que não me pertencia’, diz produtor

‘Fui educado que não me pertencia’, Internet no campo cresce, mas qualidade é baixa
Em uma época em que o celular é como uma parte das pessoas, as zonas rurais vivem um cenário desigual: ainda existe muita gente desconectada — e não por escolha própria.
No campo, a tecnologia avança com a chamada agricultura 5.0. Ela usa inteligência artificial para aplicar insumos com mais precisão e até tratores autônomos.
Enquanto isso, muitos produtores ainda não conseguem nem checar a previsão do tempo, para saber quando plantar.
Mais de 1,3 milhão dos domicílios rurais não tinham acesso à internet em 2024, o equivalente a 15% do total, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Veja o avanço da internet nos domicílios rurais em quase 10 anos
arte g1
A qualidade da internet que chega até as pessoas do campo é pior: 52% dos imóveis rurais não têm acesso às redes 4G ou 5G em 2025, de acordo com o levantamento da Associação ConectarAGRO em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (UFV).
O número é ainda menor quando se considera a área disponível para uso agrícola: apenas 34% das lavouras possuem esse tipo de sinal.

O cafeicultor Ademar Pereira cresceu sem acesso à internet ou sinal de celular. A conexão só chegou a cidade em 2021, após o início do projeto Semear Digital, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O g1 visitou Caconde em julho, para entender a diferença que a internet fez na vida dos trabalhadores rurais.
E os problemas não se limitam à lavoura: sem a conectividade, os acessos à saúde, educação e segurança também são precários, aponta Durval Dourado Neto, pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq – USP).
Mas por que falta conexão? Isso acontece, principalmente, pelas dificuldades de achar um modelo que funcione em todo o país, considerando as diferenças estruturais dele. Com isso, é preciso ter diversas estratégias e um alto investimento para atender todas as regiões. Veja os detalhes a seguir.
Onde falta conexão
Em 2025, o Amazonas é o estado onde mais falta conexão no campo. Já o Distrito Federal lidera o uso de internet rural. Os dados são do Indicador de Conectividade Rural (ICR), desenvolvido pela ConectarAGRO e a UFV.
Veja o índice de conectividade rural por estado
Arte / g1
Os dados foram calculados com base em informações públicas e georreferenciamento. Os pesquisadores avaliaram a conexão nos seguintes locais:
áreas agricultáveis, ou seja, onde pode ter alguma atividade agrícola, como plantio e criação de animais;
escolas;
postos de saúde;
domicílios de agricultura familiar;
territórios indígenas;
área de preservação ambiental.
O objetivo do estudo é apoiar políticas públicas para ampliar o acesso à internet no campo.

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O que impede a conexão rural?
O tamanho do Brasil e a variedade de terrenos dificultam levar internet para todo o país. Segundo Neto, pesquisador da Esalq, esses dois obstáculos causam outros problemas. Entenda abaixo.
Formação do país: o Brasil é formado por diferentes relevos; existem áreas montanhosas e de floresta, onde é difícil levar a internet a cabo, por exemplo. Dessa forma, em cada região pode funcionar um tipo diferente de sinal, como satélite ou rádio.
Alto investimento: quanto maior a infraestrutura que precisa ser instalada, maior é o custo.
Precisa ser um investimento interessante: o gasto precisa compensar. Para o governo, isso depende do número de pessoas atendidas. Para empresas, da atividade econômica local.
Mas o desafio não para na chegada da internet: a tecnologia deve ser usada para melhorar a produção, por exemplo, usando aplicativos com inteligência artificial, drones e tratores autônomos.
“Eu acho que conectividade no campo só faz sentido, do ponto de vista agrícola, se eu tiver tecnologia digital associada”, afirma Luciana Romani, coordenadora de parcerias do projeto Semear Digital.
Mas, para isso acontecer, os agricultores ainda enfrentam barreiras. O pesquisador da Embrapa e autor de uma pesquisa sobre agricultura digital no Brasil, Edson Bolfe, mostra os principais desafios apontados por eles:
70% citaram o alto custo para comprar máquinas, equipamentos e aplicativos;
quase 50% disseram que é a falta de internet ou baixa conectividade dentro da propriedade;
cerca de 40% apontaram o valor para contratar um serviço especializado;
aproximadamente 40% afirmaram não saber qual tecnologia usar.
As empresas que oferecem soluções tecnológicas no campo também listaram obstáculos parecidos:
61% apontaram problemas ou falta de conexão à internet;
quase 60% disseram que valor do investimento é alto;
cerca de 50% citaram a falta de mão de obra qualificada;
mais de 40% relataram falta de acesso dos usuários a capacitação tecnológica.
Esse último ponto é considerado fundamental para a pesquisadora da Embrapa.
“Não adianta nada você ter isso tudo [de tecnologia], se o agricultor não sabe usar”, diz Romani.
Qualidade ruim é o principal problema
Parte da população rural pode até ter internet, mas o sinal muitas vezes oscila muito, é fraco ou ainda nem chega até a lavoura. Esse obstáculo em infraestrutura pode limitar a forma como o produtor vai utilizar a tecnologia.
A pesquisa realizada por Edson Bolfe, da Embrapa, aponta que os produtores rurais podem ser enquadrados em três grupos:
Iniciantes: ainda que não tenham acesso à internet na propriedade, quando conseguem conexão, a usam para se informar, comprar insumos (como defensivos e fertilizantes), vender seus produtos, consultar GPS e sistemas de perguntas e respostas automáticas.
Intermediário: usam redes de sensores na lavoura, para avaliar, por exemplo, qualidade do solo e da água. Fazem uso de imagens de satélite ou drones e de aplicativos que auxiliam nas tomadas de decisões na lavoura.
Avançado: usam inteligência artificial, robótica e automação. Também fabricam peças 3D para solucionar problemas nos próprios maquinários. Essas propriedades são conhecidas como “smart farms”, ou, em português, “fazendas inteligentes”.
A internet no campo também ajuda o meio ambiente. Por exemplo, o uso de aplicativos que permitem a chamada “agricultura de precisão”. Eles informam aos produtores o quanto usar dos insumos (agrotóxicos, fertilizantes, ração, entre outros), para evitar desperdícios e aumentar a produtividade.
No caso dos agrotóxicos, é possível gerar uma economia de até 90%, aponta Durval Dourado Neto, da Esalq.
A conectividade também é uma arma no combate aos incêndios no campo. “É uma verdadeira catástrofe quando você não tem a conectividade: você demora para saber onde tem o fogo, você não sabe o que você vai fazer”, diz Galvão, da UFV.
A conexão também melhora a vida de quem vive no campo, com mais acesso à saúde, educação e segurança.
O piscicultor Tiago Oliveira, por exemplo, sofria com roubos de tilápias frequentes em sua represa em Caconde (SP). O prejuízo chegava a R$ 20 mil por gaiola perdida.
Os assaltos só pararam em 2022, quando ele conseguiu sinal de internet e instalou câmeras de monitoramento.
Outro problema comum no campo é a falta de mão de obra, que piora em áreas sem internet.
“Quando o operador vai escolher em qual fazenda vai trabalhar, ele prefere uma que tenha internet, porque ele pode estar mais próximo da família, continuar fazendo treinamentos. E aí, quanto mais tecnologia a gente tem, mais suporte esse operador tem no campo”, diz Paola Campiello, presidente da Associação ConectarAGRO.
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Caconde passou a ter acesso a internet após participação no projeto Semear Digital
Fábio Tito

Fonte:

g1 > Agronegócios

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